sábado, 15 de dezembro de 2012

ATÉ PENSEI


Junto à minha rua havia um bosque 
Que um muro alto proibia 
Lá todo balão caia, toda maçã nascia 
E o dono do bosque nem via 
Do lado de lá tanta aventura 
E eu a espreitar na noite escura 
A dedilhar essa modinha 
A felicidade morava tão vizinha 
Que, de tolo, até pensei que fosse minha 
Junto a mim morava a minha amada 
Com olhos claros como o dia 
Lá o meu olhar vivia 
De sonho e fantasia 
E a dona dos olhos nem via 
Do lado de lá tanta ventura 
E eu a esperar pela ternura 
Que a enganar nunca me vinha 
Eu andava pobre, tão pobre de carinho 
Que, de tolo, até pensei que fosses minha 
Toda a dor da vida me ensinou essa modinha.


                                                Chico Buarque

domingo, 4 de novembro de 2012

SUTILMENTE




E quando eu estiver triste
Simplesmente me abrace 
Quando eu estiver louco 
Subitamente se afaste 
Quando eu estiver fogo 
Suavemente se encaixe 
E quando eu estiver triste 
Simplesmente me abrace 
E quando eu estiver louco 
Subitamente se afaste 
E quando eu estiver bobo 
Sutilmente disfarce 
Mas quando eu estiver morto 
Suplico que não me mate, não 
Dentro de ti, dentro de ti 
Mesmo que o mundo acabe, enfim 
Dentro de tudo que cabe em ti 

Samuel Rosa/Nando Reis

terça-feira, 30 de outubro de 2012

DESRESPEITO


Fico indignada

com o desrespeito,
o julgamento,
a arrogância,
a falta de consideração.

Por que é tão difícil...
pensar no outro,
colocar-se em seu lugar,
supor suas dores
seus temores,
suas dificuldades?

Afinal,
quem disse que somos diferentes?

Nossa conta bancária?
O bairro onde moramos?
A cor da nossa pele?

Quanta bobagem!

Vamos abrir os olhos,
antes que a dor nos procure
e
à força,
nos cure!

Cacilda ZeraikPS.: Não há vitória no grito.

segunda-feira, 23 de julho de 2012


Não sinto nada mais ou menos, ou eu gosto ou não gosto.
Não sei sentir em doses homeopáticas.
Preciso e gosto de intensidade, mesmo que ela seja ilusória
e se não for assim, prefiro que não seja.
Não me apetece viver histórias medíocres,
paixões não correspondidas e pessoas água com açúcar.
Não sei brincar e ser café com leite.
Só quero na minha vida gente que transpire adrenalina de alguma forma,
que tenha coragem suficiente pra me dizer o que sente antes, durante e depois
ou que invente boas estórias caso não possa vivê-las.
Porque eu acho sempre muitas coisas - porque tenho uma mente fértil e delirante - e porque posso achar errado - e ter que me desculpar - e detesto pedir desculpas embora o faça sem dificuldade se me provarem que eu estraguei tudo achando o que não devia.
Quero grandes histórias e estórias;
quero o amor e o ódio; quero o mais, o demais ou o nada.
Não me importa o que é de verdade ou o que é mentira,
mas tem que me convencer, extrair o máximo do meu prazer
e me fazer crer que é para sempre quando eu digo convicto que "nada é para sempre."

(Gabriel Garcia Márquez)

quinta-feira, 8 de março de 2012

AS MULHERES SÃO FANTÁSTICAS!


A mãe e o pai estavam assistindo televisão quando a mãe disse:

- Estou cansada e já é tarde,vou me deitar !!!
Foi à cozinha fazer os sanduíches para o lanche do dia seguinte na escola, passou água nas vasilhas das pipocas, tirou a carne do freezer para o jantar do dia seguinte, confirmou se as caixas de cereais estavam vazias, encheu o açucareiro, pôs tigelas e talheres na mesa e preparou a cafeteira do café para estar pronta para ligar no dia seguinte.
Pôs ainda umas roupas na máquina de lavar, passou uma camisa a ferro, pregou um botão que estava caindo. Guardou umas peças de jogos que ficaram em cima da mesa, e pôs o telefone no lugar. Regou as plantas, despejou o lixo, e pendurou uma toalha para secar. Bocejou, espreguiçou-se e foi para o quarto. Parou ainda no escritório e escreveu uma nota para a professora do filho, pôs num envelope junto com o dinheiro para pagamento de uma visita de estudo e apanhou um caderno que estava caído debaixo da cadeira. Assinou um cartão de aniversário para uma amiga, selou o envelope, e fez uma pequena lista para o supermercado, colocou ambos perto da carteira.
Nessa altura, o pai disse lá da sala:
- Pensei que você tinha ido se deitar.
- Estou a caminho - respondeu ela. Pôs água na tigela do cão e chamou o gato para dentro de casa. Certificou-se de que as portas estavam fechadas. Passou pelo quarto de cada filho, apagou a luz do corredor, pendurou uma camisa, atirou umas meias para o cesto de roupa suja e conversou um bocadinho com o mais velho que ainda estava estudando no quarto. Já no quarto, acertou o despertador, preparou a roupa para o dia seguinte e arrumou os sapatos. Depois lavou o rosto, passou creme, escovou os dentes e acertou uma unha quebrada. A essa altura o pai desligou a televisão e disse:
-Vou me deitar.
E foi. Sem mais nada.

(Carlos Drummond de Andrade)

PS.: Parabéns a todas as mulheres!
        PARABÉNS MÃE!!!